quinta-feira, 16 de abril de 2009

esses

sou sem ser
só,
sonho: sendo

seria simples sobreviver
sem sintaxes
sem segredos

sentimentos
sem sentido
são
sortilégios
sorrateiros

(esses esses
excessivos
sussurram
nos meus ouvidos
o dia inteiro!)

sons suspensos
outros submersos
surpreendem
nos meus versos

sílabas são peças
do meu quebra-cabeças-universo

10 comentários:

  1. Fonemas e fonemas sendo sintaxes, segredos. sílabas poéticas, essas!
    Genial esse jogo de sss

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  2. Seu poema - Marcia - é de prima!
    Parabéns!

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  3. Aqui, uma aula de fazer poema. Em outro poema dessa rodada, a poeta evocou o mar através do ritmo do poema. Neste aqui, usou a fonética (sons linguodentais fricativos...rsrs) para evocar os sussurros.

    Um dado interessante: na estrofe que contém o único verso em que esse fonema não predomina, a poeta divide o poema em dois.

    "(esses esses / excessivos / sussurram / nos meus ouvidos /o dia inteiro!)"

    Aqui, então, estabelecemos: há os sussurros externos, que são ouvidos pelos canais auditivos; e os internos, ouvidos pela mente, reflexos dos primeiros. Tanto que o eu-poético afirma que esses "sussurros" são

    "sons suspensos / outros submersos / surpreendem / nos meus versos"


    O que divide, separa os "sussurros vossos" dos "sussurros meus" é o eu. Está mesmo nos versos

    "nos meus ouvidos / o dia inteiro"

    Eu até quereria nem pensar que esse poema foi escrito por um médico psiquiatra. Mas foi.

    Talvez, se a poeta fosse naturalista, as dores (os sussurros) que lhe motivariam a fazer poesia, que a surpreenderiam, seriam os sussurros da natureza, que também sofre. Entretanto, é psicanalista, e as dores que lhe tocam são as dores de outras psiquês.

    Ótimo poema para encerrar a rodada, Marcia.

    E a cada leitura, eu fico mais seu admirador.

    (os seus sussurros sussurram também assim nos meus versos)

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  4. Marcia sempre nos brinda com poemas cheios de novidades e este não fugiu da regra.
    É poesia para ler e reler sem pressa. Uma poesia quando é relida renova-se em facetas completamente diferentes.
    Este dom que Marcia tem de renovar é simplesmente fascinante.
    Forma,conteúdo e conjunto em absoluta harmonia.

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  5. Conseguistes unir as idéias de dois poemas meus,
    Sinestesia e Rendição. Fez uma magia!
    Gostei bastante... Mostrou ‘sensorialmente’ como é o momento de nossa rendição aos versos... De como o universo de nossa mente enxerga, sente o universo ‘de fora’. Gostei, gostei.

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  6. O terceiro verso me pegou de jeito:

    "sentimentos
    sem sentido
    são
    sortilégios
    sorrateiros"

    Em som, forma e sentido!
    E, até então, eu estava saboreando a construção em sonoros 'S' abundantes e 'iniciantes'. Confesso que fiquei um pouco triste quando eles mudaram de lugar, mas fui novamente animada pela estrofe final: perfeita!
    Parabénsssss

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  7. Beleza de poema. Este é daqueles para se ler em voz alto, interpretando. Maravilhoso!

    A última expressão me chamou muito a atenção: "quebra-cabeças-universo".

    Que "cabeças quebradas" seriam essas? A do eu-lírico? Da autora? Cabeças daqueles que lhe sussurram aos ouvidos? Uma "Cabeça-universal"?

    Gostei, gostei. Grando jogo de sonoridade que prima pela estrutura e ritmo, mas não perde em nada no conteúdo. E as metáforas também estão lá!

    A estrofe entre parênteses, sobretudo, foi a que mais me cativou. O início dela "esses esses..." dá margem a duas interpretações. Para me fazer entender, vou usar acentos. Teríamos "esses ésses" (referindo-se à letra "s"), e "esses êsses" (referindo-se ao próprio pronome). E, tomando este modelo, poderíamos ainda chegar a outras duas situações:

    ésses ésses
    ésses êsses

    Interessante esse jogo... Tentem jogá-lo...

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  8. Esses esses podem sugerir alguém dormindo, devaneios, alucinações quando está tudo anuviado ou confusão de pensamentos e instrospecção do eu-lírico. Óbvio meu comentário!

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  9. Delicioso não apenas o poema,
    mas tudo que sobre ele foi dito.

    Sem investigar a real intenção da autora,
    eu apenas o teria começado assim,
    com uma vírgula a menos:

    "sou sem ser

    sonho: sendo"

    Parabéns, Márcia!

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