quarta-feira, 8 de abril de 2009

(meu) Fim

Imagem: David Mack



A sombra da vida
Essência insensata
Ou certeza inata?
Verdade ingrata.
O caroço das coisas
e a casca também
O miolo do mundo
O fundo, o além
A cinza das horas
Do mal ou do bem?
O pouco de tudo
Faz louco de mim
O amargo interno
O etéreo eterno
O (meu) fim

10 comentários:

  1. Outro tema a que recorro, porque me intriga - e que me encanta ver em outros poetas: o tempo, nossa relação com a incerteza que ele exerce e, ainda, quanto tempo temos e, afinal, a que nos destinamos.

    Este poema agradou-me bem mais, porque "recria" algumas imagens, o que é fundamental em poesia (é o que acho; não quero limitar ninguém a nada, ok?!).

    Quando digo "recriar imagens", digo que, ao aproximar uma coisa (ou palavra) a significações dúbias, deliberadamente imprecisas, o poeta cria uma metáfora. Eu gosto de metáforas, gosto de buscar essas associações. E, o texto, evocando-as, pede que eu, ao lê-las, também as recrie num "universo" que não é ao que elas usualmente pertencem: é o sentido mítico das palavras.

    Neste poema, temos a evocação de imagens facilmente identificáveis, e que associei, sei lá por quê, a uma árvore, o pé de algum fruto amargo. É sob essa árvore, a vida, que me escondo à sua sombra, que como de seus frutos amargos de tempo e de existência. E desses frutos, nascidos a partir dessa árvore, é que me sustento - ainda que de modo insatisfatório.

    O que "Faz louco de mim", o que é "etéreo eterno" é a incerteza. Isso se traduz no poema através dos questionamentos (isso ou aquilo?, um ou outro? verdade ou insensatez?). Esses questionamentos não são respondidos, mas o eu-poético faz uma afirmação:

    "O pouco de tudo / faz louco de mim"

    E, sem muita certeza, mas ainda assim com segurança, assevera:

    "O amargo interno / o etéreo eterno / o (meu) fim" - ou seja: a minha destinação é estar para sempre sem essas certezas, tendo que conviver com porções pequenas da verdade, cinzas das horas, um naco do que há no "miolo do mundo".



    Sem sombra de dúvida, é um dos poemas que mais gostei de ler aqui no Estúdio.

    ResponderExcluir
  2. Bom, fica difícil dizer alguma coisa depois do que o Volmar escreveu. Mas mesmo assim, direi: é a degradação (só para usar esta palavra, degradação :)) da vida, do mundo. A certeza de que nada é eterno.
    E sem dúvido não foi o que mais me apeteceu, só pra citar, gostei mais daquele do Augusto, Pessoa e Manuel.

    ResponderExcluir
  3. Já havia comentado com a Jú que esse poema era O seu Melhor, o melhor de si... Mesmo sendo o seu fim é um ótimo começo... Que belo poema tristonho. E foi me remetendo a tantos paradoxos, que essa poética me cativou! Curti bem :D

    ResponderExcluir
  4. Eu não creio que esse seja O meu melhor poema - pois acredito que o melhor poema é o de amanhã - mas sei que é o preferido da Taty, e isso conta muito!

    Assim como conta a profunda análise feita pelo V. Realmente eu quis dizer muitas coisas nestas poucas palavras... muito do que eu sinto - foi autobiográfico (não tem hífen isso, ou tem?) SIM!
    Assim como 'fênix' e alguns outros (nem todos) que aqui estão.

    Sabem a tal 'loucura genial' do Augusto?
    É algo parecido - tirando a parte 'genial' (risos) - mas um dia eu chego (quase) lá!
    Beijús

    ResponderExcluir
  5. muito bom, mesmo

    um ponto que ainda não mencionaram: a citação a manoel bandeira, muito pertinente... a cinza das horas é o mal E o bem...

    ResponderExcluir
  6. Que lindeza de declaração à vida, citando a morte. boa idéia com grande tensão poética. Explorou fonemas e mostra um estilo , um sotaque seu, Ju. Eu acho que já li este no seu blog, mas não estou certa disso. Aqui ele me agradou tanto quanto onde foi que eu o tenha lido.

    ResponderExcluir
  7. Foi no Blog sim, Bea.
    Como a maioria dos outros, exceto 'Fênix' e o Haiku, que estrearam aqui, mas também já estão lá!
    Obrigado pelos comentários!!!
    Beijus

    ResponderExcluir
  8. Poema forte.

    Além de belas imagens apresentadas e reflexões sobre o ser do artista, tem também uma estrutura muito boa. O ritmo é ótimo, o jogo de palavras caiu muito bem.

    A primeira coisa que me veio à mente com "A sombra da vida" foi a Morte. A Morte é A Sombra da Vida. E o poema fala dessa perplexidade do poeta perante a Morte. Não que ele esteja prestes a morrer, mas está diante de uma Morte que está em tudo e a todo momento tira vida desse tudo, a Morte enquanto algo maior que, se ainda não o veio chamar, um dia virá.

    Lembrei do Ferreira Gullar em certo ponto. Há referêncai a ele?

    A única coisa que me incomodou foi o "ponto" em "Verdade ingrata." - preferiria sem ele.

    ResponderExcluir
  9. Exatamente Carlinhos... A morte é o foco.
    Inclusive a imagem é uma apologia a 'morte' como é representanda enquanto personagem dos 7 perpétuos (Sandaman, Neil Gaiman).
    A passagem do tempo (como outros colegas disseram) nada mais é que a 'morte lenta', ou um presságio da.
    Quanto à Ferreira Gullar, confesso que é a primeira vez que ouço falar! (vou até pesquisar a respeito).
    Quanto a "Verdade Ingrata" - pra mim é fundamental - e sendo ela indigesta, nunca cai bem... Faz sentido!
    Obrigado pelos comentários!
    Beijus

    ResponderExcluir