domingo, 3 de maio de 2009

A bolha


há em mim uma bolha

 

resistente aos segredos

às dúvidas e ao destino

ao sufocante espaço que lhe designei

entre as verdades incontestáveis

 

mantém esse corpo vivo

cobrem-na a carne e as lembranças

cobrem-na por todos os lados

amoldou-se de dentro para fora

 

se de vazio ou

de incompletude ou

de infinito é repleta não sei

ignoro seu conteúdo

 

nasceu comigo

não aumenta

não diminui

mas está-se degradando

 

não provoca dor nem prazer

nem faz bem ou vicia

nem modifica coisa alguma

nem tampouco se manifesta

 

incita-me a perscrutar

sua superfície que já foi lisa

temo que seu desejo

seja finalmente romper-se

 

às vezes escapa-me

aos poucos cuidados que lhe dedico

desliza sem ser notada

assume uma nova forma

 

cobre-se de atrevimento

veste-se com paixão

tira-me o sono e se exibe

não raro me desacomoda

 

só assim quando foge

quando não em mim

nem nela ou em pensamento

vejo-a inteira, como de fato é

4 comentários:

  1. que bonito, isto, mr.v! interessante... estou lendo assim: os poetrix falam do ser-poeta, que é movido por um desejo vermelho-gente, que usa o corpo pra emitir sussurros, que vêm... da bolha! ah, essa bolha sempre quer estourar... mas não estoura... cresce, muda, toma cores como se de sabão fosse feita... essa bolha, é vc!

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  2. A bolha eu acompanhei até o verdadeiro chão.
    Vc tem imagens assustadoras. Gosto da intensidade e da forma corajosa com que vc a coloca.
    Coisa bacana de ver, Fuerte!

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  3. Que tremenda auto-analise faz este eu-lírico, hein?

    "Há em mim uma bolha"
    Condensa tão bem a idéia da busca eterna e infinita pelo autoconhecimento.
    Melhor deixar a bolha apenas sê-la, assim, incógnita, fazendo da curiosidade de sabê-la, forte impulso para a própria existência.

    Esta idéia me guiou, sustentada por diversos versos como: "ignoro seu conteúdo"
    E assim por diante... até que, do meio ao fim do poema, surgem versos, um tanto contraditórios, que muito me instigaram:

    "mas está-se degradando"
    "nem tampouco se manifesta"

    Até que surge "não raro me desacomoda"
    E a última estrofe,concordando com aquilo dito anteriormente... o que a bolha guarda?
    A bolha traz, em si e por si, questões indissolúveis, inquietantes e por vezes encantadoras - um misto de coisas que ao emergir do âmago do ser podem ser traduzidas como 'inspiração'.

    Fiquei inspirada - minha bolha moveu-se!
    Abraços

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  4. Hum... essa bolha... sei não... De início, achei que fosse algo como uma personalidade de isolamento, que bloqueia o eu-lírico de envolver-se com o mundo. Mas, depois, mais ao fim, parece que a tal bolha está mais para uma "essência"...

    Enfim, de uma maneira ou de outra, o poema traz boas imagens. É uma construção elaborada, com palavras bem escolhidas e ritmo acertado.

    Mais um belo resultado, V.

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